sexta-feira, 31 de maio de 2013

Desenvolvimento pré-natal


       Antigamente só se falava em vida após o nascimento da criança no entanto hoje acredita-se que fisicamente a vida começa no momento da concepção, isto é quando o espermatozóide fecunda o óvulo.
        Imediatamente a célula se divide em duas que por sua vez se divide em quatro e assim sucessivamente.
        Esta fase rápida de crescimento dura cerca de 280 dias.
Podemos considerá-la dividido em três períodos:
     1- Período germinal - desde a concepção até ao 15º dia onde se verifica rápida divisão celular, viagem ao longo da trompa de eustáquio e fixação à parede do útero.
     2- Período embrionário - da 2ª semana até à 8ª semana onde se verifica desenvolvimento dos órgãos e principais sistemas (respiratório, digestivo e nervoso). Fase em que o embrião está mais vulnerável a influências do ambiente pré-natal.
     3- Período fetal - do 2º mês até ao nascimento, aparecimento das primeiras células ósseas (crescimento acelerado e complexificação dos órgãos). Registam-se os primeiros movimentos, "não são sujeitos passivos", - dão pontapés, viram-se, chupam no polegar.

        Durante a vida intra-uterina, o indivíduo poder receber a influência de vários factores que determinarão o curso do seu desenvolvimento, sendo alguns deles: a idade e dieta da grávida, o uso abusivo de drogas e medicamentos, infecções.
        De uma forma geral, o período pré-natal tem um significado psicológico, social e biológico quer para a criança, quer para a família. Este afeta a criança mesmo antes do seu nascimento.
        Quanto maior a idade da mãe maior é a probabilidade do filho ter problemas.




Gravidez semana a semana



Exercício físico durante a gravidez

     Os exercícios promovem o tônus muscular, a força e a resistência, o que ajudará o corpo a carregar o peso extra da gravidez, prepará-lo-à para o esforço do parto e ainda ajudará a que o corpo volte à forma depois que o bebé nascer. 

     A atividade física na gestação também diminui desconfortos físicos, como dores nas costasprisão de ventrefadiga e inchaço, além de ajudar a manter o humor mais estável e a auto-estima e o sono em dia.

     Quando uma mulher tem um bom condicionamento físico antes de engravidar, ela fica com mais condições de manter um bom nível de atividade durante a gestação. Contundo, não deve experimentar desportos novos ou de mais impacto. 

Cuidados a ter


Algumas mulheres precisam de mais cuidados para fazer exercícios. Cada mulher é um caso particular e por isso, antes de iniciar qualquer atividade física, deve informar-se junto do seu médico. Algumas das condicionantes sao: 

• se teve alguma ameaça de aborto espontâneo; 
• se teve um bebê prematuro no passado; 
• se sabe que corre risco de um parto prematuro;
• se sabe que sua placenta está baixa; 
• se teve sangramento forte; 
• se teve problemas na coluna lombar ou nas articulações do quadril; 
• se tem alguma doença pré-existente; 
• te tem pressão alta; 
• se sabe que vai ter mais de um bebê.

Exercícios mais adequados 

     Caminhadascorridas leves, natação, hidroginástica e bicicleta ergométrica são considerados exercícios seguros para serem praticados durante a gestação, assim como Ioga e pilates , sendo praticados com o acompanhamento de um profissional especializado em lidar com grávidas.

A rotina de exercícios deve ser alterada ao longo dos nove meses de gestação

     Mesmo que a grávida seja ativa antes da gravidez, o seu corpo naturalmente terá a tendência de diminuir o ritmo, para acomodar o útero em crescimento. 

     É especialmente importante durante o primeiro trimestre evitar elevar demasiado a temperatura do corpo. Passado esse período, também precisará de eliminar exercícios que sejam feitos no chão (de barriga para cima) ou em que você fique de pé por muito tempo - ambos podem reduzir o fluxo de sangue para o bebê. 



Exercícios recomendados para o pós-parto

     Primeiro, a grávida deve certificar-se de que está fisicamente pronta, aconselhando-se com o seu médico; depois deve iníciar o processo de retomar a forma antiga com uma série de alongamentos e exercícios para fortalecer o corpo. Quando conseguir, acrescente uma segunda série de exercícios. 

     Se o parto foi através e cesariana pode começar a fazer abdominais leves e exercícios para o assoalho pélvico assim que o médico aconselhe. 


Considerações finais


     Durante as diversas fases da vida, a atividade física praticada de forma regular e adequada constitui uma das funções ideais para uma boa manutenção da forma física. A gestação não é sinônimo de contra-indicação para essas atividades.


     É importante destacar que todo exercício deve ser feito de forma personalizada, levando em consideração cada gravidez, sendo sua prática consentida pelo obstetra, bem como acompanhada por um profissional de Educação Física; no entanto, a gestante não deve ultrapassar seus limites.



Fertilidade

     A partir dos 30 inicia-se um decréscimo da fertilidade numa mulher, pois a libertação do óvulo, que dá origem ao período fértil é cada vez menos frequente. Quanto mais avançada for a idade mais tempo é necessário para conseguir conceber.
     A partir dos 35 a endometriose (uma doença que se caracteriza pelo crescimento das placas de tecido endometrial, que normalmente só se encontra no revestimento interno uterino (endométrio), fora do útero) também começa a ser mais comum, interferindo na capacidade de engravidar. No entanto, e embora os problemas de infertilidade sejam mais comuns nestas idades, muitos deles podem ser tratados. 



Mutações


     A probabilidade de ocorrer uma mutação aumenta com a idade porque os gametas femininos vão ficando envelhecendo assim como a mulher e por isso tem menos probabilidade de se desenvolverem corretamente, vão-se degenerando. A partir dos 35 anos o risco de 
malformações congénitas no bebé e aborto espontâneo aumenta consideravelmente.


     Existem dois tipos de mutações cromossómicas:

                                                      -Estruturais: As mutações cromossómicas estruturais podem provocar alterações no número de genes ou alterações no arranjo dos cromossomas, como por exemplo,a síndrome de cri du chat (síndrome do miado do gato), em que falta um fragmento do braço curto do cromossomo 5 
                                                      -Numéricas As mutações cromossómicas numéricas são variações no número de cromossomas,como por exemplo, síndrome de Down, provocada pela trissomia do cromossomo 21.




Controvérsia hereditariedade vs meio

Não existe nenhum ser humano igual, cada um tem as suas características, que os tornam únicos. No entanto, para conseguirmos explicar este facto, temos que ter em conta dois aspectos fundamentais: o meio e a hereditariedade.

O que é a hereditariedade?
      O património genético do indivíduo define-se na sua singularidade morfológica, fisiologia, sexual (ser homem ou mulher). O temperamento é determinado por variações individuais do organismo, concretamente a constituição física (a cor da pele, dos olhos, do cabelo, etc.) e o funcionamento dos sistemas nervoso e endócrino, que são em grande parte hereditários.





O estudo dos gémeos – um dos métodos usados para analisar o papel da hereditariedade – demonstrou que, na generalidade, a semelhança é menor quando se trata da personalidade, em relação à constituição física. 

Nós herdamos um conjunto de genes provenientes dos nossos pais. Designamos por genótipo o património hereditário com que fomos dotados. No entanto, as características de um indivíduo não ficam dependentes apenas do código genético que recebem aquando da sua concepção – ele sofre a influência do meio ambiente. Designamos por fenótipo todas as características fisiológicas e psicológicas que um indivíduo apresenta. O fenótipo corresponde à “aparência” do indivíduo, ao conjunto de traços que resulta da interacção entre genótipo e o meio.

O que é o meio?
O meio influencia o ser humano no decorrer da sua vida. Assim, o meio é constituído por elementos que intervêm no comportamento de cada indivíduo. è importante dizer, que esta influência é também visível nos nove meses em que a criança está a desenvolver-se. Quando a mãe tem comportamentos incorrectos, como alimentar-se mal, ingerir álcool, ou ser fumadora, etc., pode trazer problemas físicos e mentais no desenvolvimento da criança, provocando nesta uma dependência das mesmas substâncias.

Hereditariedade ou meio?
Há quem defenda que o nosso desenvolvimento é influenciado sobretudo pelo meio, ou principalmente pela hereditariedade. Porém, a hereditariedade não pode exprimir-se sem um meio apropriado, assim como o meio não tem qualquer efeito sem o potencial genético. Por isto, afirma-se que a hereditariedade e o meio interagem, determinando o desenvolvimento orgânico, psicomotor, a linguagem, a inteligência, a afectividade, etc.
São vários os exemplos que comprovam a interacção da hereditariedade e o meio. Um dos exemplos mais significativos é a inteligência – o nível intelectual mede-se através de testes de inteligência. O grau de inteligência (Q.I.), relaciona-se intimamente com o meio. Por exemplo, quando a criança está inserida num ambiente economicamente menos favorável, este é normalmente menos estimulante intelectualmente, daí que a criança tenha um Q.I mais baixo. Contudo, temos também uma situação inversa, dependendo da personalidade de cada um, visto que a mesma situação de pobreza, pode ser um estímulo para atingir um nível cognitivo mais alto que permita uma ascensão social e económica.
Existem também estudos que relacionam a inteligência com a afectividade familiar. Por exemplo, verificou-se que crianças que foram adoptadas depois de terem vivido em orfanatos manifestaram um aumento no seu Q.I, precisamente provocado pela afectividade e consequente estímulo.
Não podemos, contudo, restringir ao meio a influência no desenvolvimento do Q.I em cada criança. A hereditariedade assume também uma importância crucial. O melhor exemplo é o caso dos gémeos homozigóticos. Existem estudos que comprovam que gémeos verdadeiros separados à nascença e criados em meios sócio-económicos diferentes, têm um Q.I. semelhante, bem como, outras características de hereditariedade genética, como sendo o temperamento, os gestos, predisposições intelectuais…
É um erro, estabelecermos relações de causa-efeito entre o meio e a hereditariedade na influência do Q.I. ou comportamentos. Trata-se sim, de uma correlação, isto é, meio e hereditariedade interagem em conjunto com a personalidade de cada um. Por exemplo, não podemos firmar categoricamente que um indivíduo com um nível sócio-económico baixo tenha um Q.I. baixo, é provável mas não imperativo.
No fundo, meio, hereditariedade e personalidade (experiências pessoais, emoções…) actuam em conjunto na formação da personalidade do indivíduo.

A Violência Infantil

     A hereditariedade influi de algum modo na agressividade infantil, mas, sem dúvida, o meio é o mais perturbante. O que falta internamente à criança é a capacidade e a habilidade para lidar com esse ambiente que a deixa com raiva, com medo e insegurança.
A Grande Influência do Meio
· Família: membros familiares com traços anti-sociais de conduta (principalmente os pais), pais que não respeitam a autonomia dos filhos ou que são demasiadamente controladores ou que rotulam seus filhos como agressivos são factores familiares que induzem à agressividade infantil.
· Mídia: os meios de comunicação de massa têm dividido opiniões sobre a influência que exercem na criança. Podemos encontrar programas com imagens que chegam a requintes de perversidade. Os video-jogos bélicos, os desenhos animados violentos que fascinam as crianças também podem influenciar.
· Escolaridade: a escola também pode influir no desenvolvimento ou na prevenção de problemas de conduta; o pessoal da escola pode avisar aos familiares quando detecta problemas nas crianças; a escola pode proporcionar programas de estímulo de habilidades sociais, resolução de conflitos entre os alunos ou buscar outras soluções aos problemas de cada aluno.
· Condição Social: a maioria dos estudos procura relacionar o nível socioeconómico baixo com o desenvolvimento de problemas de conduta. Um desses estudos observou que a alta percentagem de crianças agressivas de pouca idade pertencia a um nível social mais baixo. Deve-se ter em conta, além disso, que esses factores diferem de uma família para outra, de forma que nem todas as famílias pertencentes a uma classe social mais baixa se caracterizam pelos mesmos padrões de conduta.
Idealizações Filosóficas
    A questão da grande influência que o meio exerce sobre a criança já vem sendo discutida há tempos. O filósofo francês Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), considerado o “descobridor da criança”, considera, juntamente com outros filósofos, que a bondade é a tendência natural e inata do homem, que só é pervertido pela civilização e pelas injustiças sociais decorrentes. Ou seja, o homem nasce bom, e a sociedade limita-se a corrompê-lo. 

Genie, The Wild Child

      A partir de um documentário da BBC da década de 70 sobre os problemas morais e éticos, tivemos a oportunidade de conhecer Genie, uma criança selvagem que sobreviveu a 13 anos de tortura, enclausurada num quarto pelos pais. Tendo o conhecimento do caso, foi a gerada a discussão sobre a problemática hereditariedade vs meio e a sua influência no desenvolvimento de uma criança.
Opinião
    O caso Genie é, ainda hoje, visto com um grau de polémica bastante acentuado.
  “Genie era um animal em comportamento, humano na forma, mudo e nu.”
     Esta afirmação poderá levar-nos a inúmeras conclusões, no fundo meras suposições tendo em conta a inconclusividade do caso.
    Após a visualização do documentário, surgiram várias indagações no que diz respeito à nossa natureza e àquela que nos foi imposta imediatamente à nascença. Vários estudiosos partem do principio de que as pessoas se comportam de acordo com predisposições genéticas – hereditariedade – e de acordo com o seu instinto, com o que lhes é inato. É chamada a teoria da natureza do comportamento humano. Por outro lado, existem outros que acreditam que as pessoas pensam e se comportam de determinada forma por serem ensinadas com esse propósito – influência do meio.
  O que acontece então quando o acesso ao meio nos é completamente negado? 
   Genie viveu longe do contacto humano desde o seu nascimento, sem estímulos a nível emocional, físico e cognitivo, privada de experienciar comportamentos afectivos e sociais, sem qualquer acesso à linguagem humana. Genie foi isolada nos primeiros 10 anos de vida, anos quais são considerados como sendo os mais cruciais para o desenvolvimento de uma criança.
  O contacto físico com outros seres humanos é essencial para satisfazermos as nossas necessidades sociais e emocionais.
     Em relação ao estudo do caso, à forma como foi inicialmente abraçado e posteriormente abandonado, a ideia de que Genie poderia ser retardada é um pouco ingrata de afirmar, e julgo poder arriscar dizer que, no fundo essa definição foi como que usada como desculpa para a desistência do caso.      Uma forma subtil mas visivelmente cruel de abandonar esta criança, mais uma vez. Este abandono transformou-se assim numa privação de tempo, numa estagnação. Assim como as crianças aprendem com o tempo a gatinhar, a caminhar, a correr e a comunicar através das palavras, Genie necessitava de tempo para absorver a explosão constante de informação que a rodeava.
Links para o documentário:

Crianças selvagens

As crianças selvagens são crianças que cresceram com contacto humano mínimo, ou mesmo nenhum. Podem ter sido criadas por animais (frequentemente lobos) ou, de alguma maneira, terem sobrevivido sozinhas. Normalmente, são perdidas, roubadas ou abandonadas na infância e, depois, anos mais tarde, descobertas, capturadas e recolhidas  entre os humanos.



        Os casos que se conhecem de crianças selvagens revestem-se de grande interesse científico. Elas constituem uma espécie de grau zero do desenvolvimento humano, ensinam-nos o que seríamos sem os outros, mostram de forma abrupta a fragilidade da nossa animalidade, revelam a raíz precária da nossa vida humana.

         Em termos de linguagem, as crianças selvagens só conhecem a mímica e os sons animais, especialmente os das suas famílias de acolhimento. A sua capacidade para aprender uma língua no seu regresso à sociedade humana é muito variada. Algumas nunca aprendem a falar, outras aprendem algumas palavras, outras ainda aprenderam a falar correctamente o que provavelmente indicia que tinham aprendido a falar antes do isolamento.
        Em termos de comportamento, as crianças selvagens exibem o comportamento social das suas famílias adoptivas.  Não gostam em geral de usar roupa e alimentam-se, bebem e comem tal como um animal o faria. A maioria das crianças selvagens não gostam da companhia humana e percorrem longas distâncias para a evitar. Algumas crianças selvagens não mostram interesse algum noutras crianças da sua idade nem nos jogos que estas jogam. Na medida em que não gostam da companhia humana, procuram a companhia dos animais, particularmente dos animais semelhantes à espécie dos seus pais adoptivos. Ao mesmo tempo, também os animais reconhecem estas crianças, aproximando-se delas como não o fariam em relação a outros humanos.
        As crianças selvagens não se riem ou choram, apesar de eventualmente poderem desenvolver alguma ligação afectiva.        Manifestam pouco ou nenhum controlo emocional e, muitas vezes, têm ataques de raiva podendo então exibir uma força particular e um comportamento claramente selvagem.
        Algumas crianças têm ataques de ferocidade ocasionais, mordendo ou arranhando outros ou até eles mesmo.
        Até hoje foram encontradas diversas crianças selvagens, na  maioria criadas por lobos mas também por muitos outros animais. Por exemplo, as irmãs Amala e Kamala de Midnapore, Isabel, a menina que vivia no galinheiro ou Gaspard Hauser de Nuremberga. O caso mais célebre é o de Victor de Aveyron com base no qual Francois Truffaut realizou um belíssimo filme.
         Também o desenho animado "Mogli, o Menino Lobo" conta a história de uma criança que se perde da família na selva e é adoptada e criada por lobos. Quando encontrada, reintegra-se facilmente no grupo de humanos, antes de ser expulsa como "bruxa" em virtude do seu "poder" sobre os bichos.

FILME "O MENINO SELVAGEM"
      Breve resumo:

     O filme“L’Enfant Sauvage d’Averyon” (O Menino Selvagem de Averyon), de Fraçois Truffaut, baseado num caso verídico, relata a história de uma criança de onze ou doze anos que foi capturada num bosque, tendo vivido afastado da sua espécie e ficando depois à guarda do Dr. Jean Itard.
     Embora se pense que o menino selvagem tenha sido abandonado no bosque quando tinha quatro ou cinco anos, altura em que já deveria dispor de algumas ideias e palavras, em consequência do começo da sua educação, tudo isso se lhe apagou da memória devido a cerca de sete anos de isolamento.   
     Quando foi capturado, andava como um quadrúpede, tinha hábitos anti-sociais, órgãos pouco flexíveis e a sensibilidade embotada, não falava, não se interessava por nada e a sua face não mostrava qualquer tipo de sensibilidade. Toda a sua existência se resumia a uma vida puramente animal.
     Assim, o seu isolamento passado condicionou a sua aprendizagem futura que, além do mais, deveria ter sido realizada durante a sua infância (época em que o seu cérebro apresentaria mais plasticidade, existindo uma facilidade de aprendizagem, socialização e interiorização dos comportamentos característicos da sua cultura). Desta forma, o menino selvagem não só tinha que lutar contra o seu passado como contra a idade avançada para uma aprendizagem, muito provavelmente, sua desconhecida, sendo esta a razão porque, segundo Itard,“ para ser julgado racionalmente, (o menino selvagem de Averyon) só pode ser comparado a ele próprio”.
     Segundo a tese de Lucien Malson, que escreveu “Les enfant sauvages” (As crianças selvagens), relatando e analisando não só este caso mas também outros casos de isolamento, o Homem é inferior a grande número de animais no seu estado de natureza. O autor defende que os animais, com o seu sistema nervoso rudimentar, não necessitam de viver com a sua espécie para realizar as acções características da mesma, não carecendo de ensinamentos devido aos seus instintos já desenvolvidos à nascença. Lançado no globo sem forças físicas e sem ideias inatas, incapaz de obedecer por si só às leis constitucionais da sua organização, o Homem só pode encontrar no seio da sociedade a posição eminente que a natureza lhe assinalou e, sem a civilização, seria, como já referi, um dos mais fracos já que, de todos os seres vivos o Homem é o que na ocasião do nascimento se mostra mais incapaz, condição necessária para os seus progressos ulteriores, e a ideia de instintos que se desenvolvem por si só não corresponde à realidade humana. Nasce inacabado e depende de uma sociedade, de uma cultura. Segundo Itard, “o indivíduo, privado das faculdades características da sua espécie, arrasta miseravelmente, sem inteligência nem afeições, uma vida precária e reduzida às funções de animalidade”. Assim, a superioridade moral, que muitos consideram ser natural nos seres humanos, não é mais do que um resultado da civilização, que contribui para a sua formação. Existe então, uma força imitativa destinada não só à educação dos órgãos como à aprendizagem da palavra, que é muito activa nos primeiros anos de vida, mas enfraquece rapidamente com o avançar da idade, com o isolamento e com todas as outras causas relacionadas com a sensibilidade nervosa.
     Com a tentativa de integração do menino selvagem na sociedade, este, que anteriormente não estava “preso” por normas e deveres morais, perdeu o poder de escolher, pois, por sua vontade, voltaria para o bosque, razão pela qual tentou fugir inicialmente. Por outro lado, conseguiu, pouco a pouco, impor-se face à Natureza, ao instinto, adquirindo cultura e atingindo outra forma de liberdade, que concorre para a formação do Homem. Note-se que uma das maiores dicotomias é cultura e natureza, percebendo-se, com o exemplo do caso do menino selvagem, o porquê desta oposição.
     Ainda que a liberdade seja um factor que está subjacente às acções especificamente humanas, podemos concluir, tendo em conta todo este caso, que existem de facto condicionantes da acção humana. Em primeiro lugar, o menino selvagem, não obstante viver numa floresta, não tinha as mesmas capacidades físicas de outros animais, ou seja, os factores biológicos também afectaram as suas acções enquanto selvagem. Em segundo lugar, surgem os factores intelectuais, pelo facto do menino não ter competências nesse sentido, o que dificultou as suas acções na sua vivência em sociedade. Por exemplo, quando o médico Itard tentou transmitir algum conhecimento no âmbito das letras, aconteceram, por vezes, ataques de fúria, pelo facto destas serem muito abstractas e, consequentemente, mais difícil foi a sua aprendizagem neste campo (neste contexto, alguns especialistas defenderem que o médico procedeu mal ao incluir letras, por serem demasiado abstractas, na educação do menino).
     Aprendeu também a desenvolver afectividade, o que foi considerado um grande progresso. Tornou-se sensível às temperaturas extremas, espirrou pela primeira vez assim como chorou. À medida que esta afectividade se foi desenvolvendo entre o menino e o Dr. Itard ou a Mme. Guérin, a aprendizagem vai-se tornando mais fácil (note-se que os factores psicológicos são bastante influenciáveis). Por último, como já foi referido, os factores sócio-culturais também influenciam as nossas acções pois, ao estarmos inseridos numa sociedade, as nossas acções e comportamentos são influenciados por ela, como se verificou com a socialização do menino selvagem, que teve de se sujeitar a regras e a deveres morais.
     Torna-se também importante salientar que, no século XIX dominava a ideia de que uma criança nasce naturalmente preparada para a vida, salvo nos casos de deterioração biológica, tendo a sociedade em geral considerado o menino selvagem um destes casos, incluindo Pinel, um célebre psiquiatra da época. Não se pode, portanto, deixar de falar numa espécie de “racismo” pois, embora de início lhe tivesse sido dada uma certa importância, rapidamente fora esquecido e considerado um idiota.
     Embora o menino selvagem de Averyon, a quem Itard deu o nome de Victor por se mostrar“sensível” ao som “ô”,tivesse conseguido evoluir, só podemos considerar essa evolução como grande se tivermos em conta o seu estado inicial. Victor conseguiu pronunciar a palavra “lait” (leite) e até mesmo escrevê-la, mas não foi dada muita importância a esta aprendizagem uma vez que não era utilizada para mostrar uma necessidade, mas sim uma espécie de exercício preliminar, que precedia espontaneamente à satisfação dos seus apetites. Através da análise da conduta do menino selvagem pode-se dizer que:
- devido à fraca sensibilidade do sistema auditivo, a sua educação ficou incompleta;
- todo o seu desenvolvimento foi lento e trabalhoso;
- apesar do seu gosto pela liberdade dos campos e da sua indiferença pela maior parte das vantagens da vida social, mostrou-se reconhecido pelo cuidados que lhe prestavam: gostava quando fazia as coisas bem, envergonhava-se com os seus erros e arrependia-se das suas irritações;
- existe, também nas crianças selvagens, uma relação constante entre ideias e necessidades, ou seja, “todas as causas acidentais, locais ou politicas tendentes a aumentar ou diminuir o número das nossas necessidades, contribuem necessariamente para alargar ou diminuir o âmbito dos nossos conhecimentos” (Itard).   
     Por fim, podemos concluir que o Homem, lançado na Terra, sem forças físicas nem ideias inatas, tanto na selva como na mais civilizada das sociedades, será apenas aquilo que dele fizerem. Segundo Jaspers (filósofo alemão), “são as nossas aquisições, as nossas imitações e a nossa educação que nos transformam em homens do ponto de vista psíquico”. O comportamento humano é uma conquista feita em consequência do processo da sua integração no meio cultural, que varia em função da sociedade a que pertence. O que nos torna reconhecidamente humanos depende de muito mais do que a nossa herança genética e biológica: é fundamental ter em conta as dimensões social e cultural para que possamos compreender os seres humanos e a forma como se comportam. Tornamo-nos humanos através da aprendizagem de formas partilhadas e reconhecíveis de ser e de nos comportarmos.               O Homem deve à cultura a capacidade de ultrapassar os seus instintos, tendo, desta forma, o poder de optar, escolher qual o caminho que considera melhor, segundo os valores em que se apoia, depois de analisar, racionalmente, a realidade. É portanto necessário “admitir que os homens não são homens fora do ambiente social” (Lucien Malson) e que necessitam, mais do que os outros animais, da vivência junto da espécie.